Meu Filho Tem um Problema
Entenda o que é e como lidar com a bipolaridade na infância
Crianças que têm o transtorno vivem uma gangorra de emoções
As crianças que m o transtorno bipolar são invadidas por uma montanha-russa desentimentos sem que possam, muitas vezes, compreender exatamente o que estão sentindo. Caracterizada pela oscilação entre períodos de extrema euforia e outros de depressão, a bipolaridade até pouco tempo era considerada uma doença de adultos. Mas estudos recentes começaram a apontar que o transtorno pode aparecer ainda na infância, e de forma mais frequente do que se imaginava. É o que concluiu uma pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Saúde Mental dos Estados Unidos e publicada na revista Archives of General Psychiatry. Após realizar mais de 10 mil entrevistas com adolescentes entre 13 e 18 anos, os pesquisadores descobriram que uma média de 2,5% desses jovens teve episódios de mania e de depressão nos últimos 12 meses e preencheu os critérios para o diagnóstico do transtorno. Ainda que não haja um estudo em grande escala sobre a prevalência da bipolaridade na população infantil, estudiosos estimam que ela atinja até 2% de crianças e adolescentes ao redor do mundo. Um número preocupante, segundo especialistas em transtornos infantis.
— Atualmente, o que se sabe é que de 20% a 40% dos adultos com o transtorno já apresentavam sintomas quando criança. Essa informação é muito importante, pois, o quanto antes o problema for tratado, menores são os prejuízos que a pessoa tem ao longo da vida — explica Silzá Tramontina, psiquiatra de crianças e adolescentes do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
A influência do ambiente
O que determina a probabilidade de uma criança ser bipolar e quais os fatores que desencadeiam o transtorno ainda não são questões totalmente esclarecidas pela ciência. Para muitos especialistas, são os genes os responsáveis por essa predisposição.
Pais que apresentam quadros de bipolaridade ou de depressão teriam chances muito maiores de ter filhos com os transtornos. Mas o ambiente em que a pessoa vive teria um papel fundamental: seria o empurrãozinho a quem está prestes a entrar nessa montanha-russa.
A infância é um período onde a mente é altamente moldável, e a quantidade de estímulos a que os bebês e as crianças estão expostos atualmente, com cores, cheiros, desenhos e barulhos, poderia explicar parte dos diagnósticos.
Pressões como a obrigação de aprender dois ou três idiomas, ser bom em algum esporte, sabe pintar e ainda tirar as melhores notas na escola podem induzir os jovens a desenvolver um temperamento mais confuso, impaciente, frenético e pouco persistente. Esse é um padrão de comportamento em bipolares.
— As principais hipóteses sobre o surgimento desse transtorno relacionam fatores genéticos ligados a alterações químicas no cérebro dessas crianças, como por exemplo, o aumento de substâncias chamadas noradrenalina e dopamina, que influenciam diretamente no comportamento — explica Gustavo Teixeira, psiquiatria da infância e adolescência e autor de livros sobre o tema.
Vaivém intenso
Crianças bipolares experimentam variações de humor semelhantes a dos adultos com o transtorno, mas nem sempre da mesma forma e intensidade. Isso causa confusão em muitos pais, que acreditam se tratar de "coisas típicas da idade". Frequentemente, jovens bipolares têm períodos de extrema irritabilidade e acabam sendo mais agressivos com familiares e colegas, prejudicando o convívio social. Uma das questões a ficar atento é a incapacidade que muitos deles apresentam em controlar seus acessos de raiva e ansiedade, colocando a si e aos outros em situações de risco. Silzá Tramontina explica que entre 25% e 45% dos adolescentes com o diagnóstico de transtorno bipolar tentam o suicídio.
— O risco é maior durante os episódios mistos e depressivos e, por isso, os pais devem ficar de olho — alerta.
Conforme o psiquiatra de crianças e adolescentes Andre Kohmann, do Hospital Santa Casa de Porto Alegre, as crianças costumam apresentar uma conjunção de sintomas como impulsividade, irritabilidade e dispersão, e podem variar de humor de forma muito mais rápida e intensa que os adultos. Em um mesmo dia, explica, podem apresentar períodos de euforia e outros de apatia e baixa autoestima:
— As formas como os sintomas costumam aparecer também são diferentes. Por exemplo, enquanto um adulto bipolar pode querer mandar ou mesmo agredir o próprio chefe se estiver grandioso e eufórico, uma criança nessa situação pode brigar com o professor sobre como é o jeito certo de dar aula para a turma, ou andar perigosamente de skate na contramão dos carros por achar que nada de mal acontecerá a ela.
Atenção aos sinais
Crianças com transtorno bipolar costumam apresentar...
... na euforia:
— Períodos de muita energia, podendo durar um dia todo ou chegar até mesmo a uma semana
— Humor e excitação elevados: uma felicidade excessiva, sem motivos, ou então irritação excessiva
— Comportamentos perigosos, como tentar pular de um carro em movimento ou então do telhado
— Assuntos de conversa com uma conotação de grandiosidade: tem superpoderes, ninguém pode com ele, todos têm de fazer o que ele mandar
— Pouca necessidade de sono
— Fala muito rápida, mudando rapidamente de um assunto para outro sem encerrar o primeiro
— Envolvimento em muitos projetos escolares e em muitas atividades no geral, sem aparentar cansaço
... na depressão:
— Humor deprimido ou irritável na maior parte do dia
— Acentuada diminuição do interesse ou prazer em todas ou quase todas as atividades
— Perda ou ganho significativo de peso
— Fadiga ou perda de energia
— Agressões a terceiros ou a si mesmo, podendo tentar o suicídio
O que fazer
Pais que suspeitam da doença em seus filhos devem procurar profissionais da área, em especial os psiquiatras de infância e adolescência, para adequada avaliação. Em Porto Alegre, uma opção é fazer pedido ao posto de saúde para encaminhar ao Programa de Crianças e Adolescentes Bipolares do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
O tratamento
Quando a criança é diagnosticada com transtorno bipolar, um conjunto de terapia com medicamentos é indicado. Normalmente, são usadas medicações que estabilizam o humor, e os atendimentos de psicologia, educação a respeito da doença, treinamento de pais e psicoterapia familiar também são importantes para bons desfechos. Quer dizer: o paciente e sua família se beneficiam muito do atendimento multiprofissional.
*Zero Hora
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